O título nos conduz a pensar em um texto que apresentará um saudosismo, lembrar o que fomos ou o que vivemos, mas o que realmente motiva esta escrita é poder pensar em quanto tempo se leva para conhecer verdadeiramente alguém.
Quanto tempo precisamos para conhecer uma outra pessoa: quer um amigo, um companheiro, uma amiga, filho, filha, o que for?
É óbvio que não há um tempo determinado. Na minha época de jovem dizia-se “só se conhece alguém depois de juntarmos as escovas de dentes” . Escovas se juntaram, se esgarçaram e nada resolveu a arte de conviver, porque uma outra arte não foi desvelada: a arte de conhecer. Isso se dá porque convivemos sem nunca conhecer.
A cada dia uma surpresa, a cada dia uma novidade. Inicialmente criamos uma imagem e a partir daí, nos adequamos para tentar entender o outro por essa imagem construída. Agarramo-nos nesse Porto Seguro. Seguro? Ficamos buscando nesse desenho traçado por nós e a cada dia, deparamo-nos com um novo, com um outro, com uma nova pessoa e vamos tentando acertar imagens, a acertar o que não entendemos, convencendo-nos de que nós é que erramos.
Entretanto, não é nada disso! Primeiro, mudamos a cada momento, cada situação é um novo enquadre e nos enquadramos a ele. Ninguém é algo fixo. Seria bem fácil conviver, se fosse desse jeito. Característica incrível essa do ser humano, ser mutável, mutante, camaleão. Um pouco mais que esse bichinho inofensivo, somos arlequim. Fragmentos que se juntam e formam um eu. E qual desses pedaços, o outro pegou, achando que conquistou um eu, completo, inteiro. Vemos o que queremos, até desconfiarmos que há um outro pedaço que tínhamos fingido em não ver ou que não chegou até nós. Não pegamos, escolhemos e ficamos com o retalho que desejamos. As outras partes ficam meio dormentes, esperando serem ativadas. E ao despertar desse torpor hipnótico, descobrimos tantas outras verdades, tantos outros fragmentos que ali estavam e não reconhecíamos que nos assustam e amedrontam.
Sabe, por tantas anos, interpretei o texto de Drumond “Os homens, as viagens” e o escritor no final discute a difícil arte de conviver, de viver, e mesmo com tanto ensinamento vindo do poeta, não aprendi, não entendi imediatamente. Hoje, depois de tanto tempo, quanto tempo? vejo que só na convivência de muito tempo, pode – se compor pelos fragmentos o todo de alguns amigos, alguns parentes, de você. Onde estavam essas mudanças que não via? O tempo revelou.
Levei tempo, muito tempo, e encontro-me perplexa fragmentada, recompondo-me e aguardando que o outro me recolha e me novamente me refaça …