Existe uma escrita feminina?

Muitos encontros já discutiram sobre esse assunto e poucas mulheres escritoras se manifestaram com um posicionamento  claro e definitivo.

Entretanto, assistindo à TV, acompanhei uma entrevista entre Marina Colassanti e Carla Camurati (mulheres importantes da literatura e do cinema) e essa pergunta foi feita para Marina. Ela respondeu categoricamente, com toda a sua sabedoria de mulher incrível que ela é, que existe, sim, uma escrita feminina.

Eu adoro Marina Colassanti, os seus livros para jovens e adultos trazem uma profundidade marcante, ela que chega a extrapolar  o existencialismo rasgado de Clarice Lispector, trazendo a doçura firme da voz  feminina – que, por muito tempo, foi feminista.

Creio que os meus ex-alunos que possam estar lendo esse texto   vão lembrar-se do livro “Ana Z, onde vai você?” em que uma menina chega à adolescência, por um  processo lento e imaginário, que sempre nos deixou sem saber aonde ir. E, na 3ª série do ensino médio, entramos nas metáforas de “A hora de alimentar serpentes”. Levamos um susto literário até reconhecermos as serpentes que saíam do livro e nos envolviam literariamente éramos nós mesmos. Uma escrita marcante e bem feminina. 

Voltamos à pergunta: “existe uma escrita realmente feminina?” Por um instante, até parei de escrever. Retomo com uma posição diferente da Marina. Entendo que o escritor, independente do gênero, transcende e traveste-se.

Nesse sentido, um homem, em toda  a sua masculinidade, pode perfeitamente entrar no universo feminino (o que, de certa forma, é maravilhoso) e buscar a sensibilidade que é de uma mulher. E uma mulher também.

Creio ser um tanto limitante falarmos de um único universo. E uma escritora possuir somente uma voz, a voz  feminina, a sua própria. Marina quis dizer mais do que a própria voz dela. E sim, algo maior, intenso que abrange outras vozes.  O escrever é uma atividade em que se fazem presentes vozes e dizeres tão diversos que, como já disse, transcende a um eu determinado. Em um  texto se inserem vozes que vão além de quem escreve. Vozes remexidas, reviradas, recriadas que dão o tom que se deseja ou que intuitivamente se externou.

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